A CRECHE DA RUA UM, VERDADEIRO OÁSIS NO MEIO DO FOGO CRUZADO DA ROCINHA
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"Há uma harmonia de tensões opostas, como do arco e da lira"
Heráclito de Éfeso
A Creche da Rua Um é um verdadeiro oásis no meio da imensa favela e também uma prova da possível harmonia entre tensões opostas, convivência entre realidades muito distintas. O refúgio fica localizado em uma rua que é o coração e o cérebro da Rocinha. É também conhecida como a Creche da dona Eliza, dirigida desde há muito tempo por Maria Elizia Pirozzi, 74 anos, uma nordestina "arretada" que não aceita ordens de ninguém. Por causa de seu temperamento explosivo já foi obrigada a "emigrar de sua favela" mais de uma vez. Quem chega lá, depois de uma subida através da rua estreita e sinuosa percebe o quanto a velha paraibana é querida por todos, desde o mais humilde morador, aos eventuais "donos do morro".
A creche fica em uma rua que é o centro nervoso da imensa favela, nos arredores de um pequeno núcleo cultural, a Casa da Cultura, um restaurante com apenas cinco mesas e uma comida saborosa, mas cujo maior atrativo são as máquinas caça-níqueis, um templo pentecostal, um salão de beleza, e um bunker onde os "donos do morro" fazem (ou faziam) suas reuniões e traçam (ou traçavam) suas estratégias. Em uma das inúmeras curvas funciona um concorrido ponto de jogo de bicho, às vezes permitido, às vezes reprimido ferozmente, conforme os humores dos policiais de plantão. Próximo à entrada funciona um posto de saúde municipal, teoricamente subvencionado pelo governo. Na parte mais alta da rua, está sendo construído um prédio que irá abrigar um batalhão policial, para segundo declarações oficiais "impor a paz em toda a comunidade".
Dona Eliza nunca se deixou abalar, nem mesmo se intimidar, nem quando foi "convidada a se retirar" para um exílio que parecia não ter fim. Já ministrou seus ensinamentos, seu modo de conviver e se manter com dignidade a milhares de crianças que foram criadas debaixo de sua saia. Muitos graças a seu esforço e perseverança passaram a acreditar que pelo conhecimento poderiam superar qualquer obstáculo ao longo da caminhada. Seu pensamento sempre foi um só:salvar as crianças, dar um rumo àqueles que ansiavam por uma palavra de carinho e de um bom prato de macarrão com aquele molho especial, que só ela sabe preparar, mesmo em meio a tiroteios, matanças, extorsões, invasões, tanto da parte dos inimigos quanto dos pretensos aliados.
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Jorge Mamão e Dona Eliza foto Alcyr Cavalcanti all rights reserved |
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Maria Elizia Pirozzi a Dona Eliza fotos Alcyr Cavalcanti all rights reserved |
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Adriana Pirozzi foto Alcyr Cavalcanti all rights reserved |
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